Sobre a democracia representativa, o papel dos partidos políticos e a justiça eleitoral na crise da representação.

O livro intitulado “Da Democracia de Partidos à Autocracia Judicial: o caso brasileiro no divã” (Fpolis : Editora Habitus. 2020) é fruto da tese de doutorado aprovada pela Universidade Federal de Santa Catarina e tem como objetivo o estudo da democracia representativa, à luz da relação entre o Poder Judiciário e os partidos políticos, a partir da teoria de base da democracia de partidos.

Tal objetivo se prende à ideia da percepção de uma crise de representatividade, cuja esperança de solução tem recaído sobre a justiça eleitoral, de onde surgem as seguintes hipóteses de trabalho: i) há compatibilidade do modelo constitucional da democracia de partidos com o papel exercido pela Justiça Eleitoral hoje?; ii) a alteração no papel da Justiça Eleitoral, desde a sua criação, com incremento de suas funções originais de 1932, é sintoma do descrédito da representação e causa desse rearranjo de funções?

É apresentada, no primeiro capítulo, a fundamentação teórica da democracia de partidos, no recorte específico dos autores alemães que trataram da Constituição de Weimar, em especial a transformação do poder popular em poder estatal. A partir daí, é realizado um bosquejo histórico dos direitos políticos no Brasil e de suas engrenagens, como os partidos, os direitos políticos e a Justiça Eleitoral, desde o Império (1824-1889) até a configuração desses institutos no direito constitucional nacional (Constituição de 1988), com vistas, nesta última fase, a apontar o modelo constitucional brasileiro.

A democracia brasileira é uma democracia de partidos e, desta premissa, advém consequências como a primazia das decisões essenciais da República serem tomadas pelo Parlamento nacional. O exame de casos judiciais é realizado para se confrontar, ao fim e ao cabo, o modelo constitucional de uma democracia de partidos com a prática judicial nacional. A propósito, os aspectos destacados da Justiça Eleitoral são realçados como a existência de funções atípicas, para então se realizar a comparação entre a justiça eleitoral e os partidos políticos. A conclusão é de uma crescente autocratização judicial dos temas relacionados ao sistema eleitoral, em prejuízo do conteúdo da Lei e com a primazia incontestável do Poder Judiciário sobre o parlamento. O modelo de produção legiferante e de mobilização popular da democracia de partidos é substituído por um modelo autocrático de representação de natureza judicial.

 

Marcelo Ramos Peregrino Ferreira

Advogado. Ex-juiz eleitoral do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina, Brasil. Doutor em Direito e autor.

Membro do CAOESTE.